Os feriados, alturas em que não é necessário comparecer no local de trabalho (caso se verifique a improbabilidade de existir), são momentos estranhos. Do ponto de vista sociológico, são instantes interessantes: cumpre-se o feriado, independentemente do motivo para o qual foi instituído, mas o cumprimento do estatuto desse dia é tomado como uma espécie de vingança para com a rotina. Ou para connosco mesmos, animais de hábitos, ou para com quem nos dá trabalho, que é, no fundo, quem ordena as pequenas alterações diárias ao nosso quotidiano.

De um modo geral, se temos chefes, não gostamos deles porque nos alteram as rotinas. E é, talvez por isso, que gostamos mais dos feriados que dos nossos patrões ou patroas - porque um chefe, acima de tudo e sem necessidade de dar muitas explicações, altera o quotidiano de quem trabalha. Não nos deixa trabalhar, porque atrapalha o que vimos fazendo com sequência, lógica, temporalidade linear. Não precisa de argumentar: manda. Já os feriados, alterando ligeiramente os nossos hábitos (perpetuados, pouco tempo depois, pelos fins de semana), não mandam em nós porque são momentos de desobediência consentida. Despenalizam, desobrigam, embora provoquem em nós uma espécie de insolvência imaterial. São como os domingos, que são a primeira (e, provavelmente, a mais importante) forma de inquietação semanal.

Aliás, as polémicas acerca do fim de alguns feriados têm sido, acima de tudo, discussões dentro de nós próprios sobre a estranha evidência de gostarmos de dias relativamente aos quais não sabemos o que fazer mas que nos vão, por assim dizer, tirar.  

Mas tudo isto é mentira. Tudo isto é profundamente censurável. Tudo isto é desumano para quem trabalha num call-center e, se não for trabalhar no feriado, tem que ir para a cama com o supervisor, para a recepcionista que tem de usar o decote perto do umbigo, para quem trabalha nas feiras, nos cafés, para quem tem de desapertar mais uma botão da camisa para vender telemóveis, para quem é promotor de iogurtes ou de perfumes ou arruma congelados numa superfície comercial gelada, por cima de uma luz branca, de pé o dia inteiro. Tudo isto é socialmente profano e de uma profunda desonestidade intelectual para quem, vivendo ao mesmo tempo que todos nós (o tempo legal, o tempo físico, o tempo psicológico), tem que trabalhar aos feriados.

25 de Abril? Sempre. Quase sempre. Quase nunca.

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